Trendbank dá perdas a Petros e Postalis

Valor

08/08/2014

Os fundos de pensão Petros, da Petrobras, e Postalis, dos Correios, receberam más notícias a respeito dos investimentos que fizeram no fundo de crédito Trendbank, fechado no final do ano passado por conta da disparada de sua inadimplência. Apenas 1,2% dos ativos da carteira do fundo, que soma R$ 409 milhões, obedeceram às boas práticas operacionais. Para quase totalidade portfólio, portanto, será difícil recuperar os créditos, por diversas razões.

Em alguns casos, falta documentação, que ainda poderá ser localizada, em tese. Mas a análise de pedaços relevantes da carteira sugere possíveis fraudes, em operações feitas com empresas inexistentes ou em que o mesmo grupo assina como “sacado” e “cedente” dos créditos. Alguns papéis entraram no fundo contrariando a sua regulamentação, caso de empresas em recuperação judicial. O valor somente dessas operações alcança R$ 51,6 milhões.

 

Esse diagnóstico está em relatório apresentado aos cotistas pelo novo gestor do fundo, o banco Brasil Plural, ao qual o Valor teve acesso. Procurada, a Postalis informou que os cotistas contrataram um renomado escritório de advocacia para apurar as responsabilidades, inclusive as assumidas pelo gestor e pelo administrador do fundo, com o propósito de embasar possível ação judicial. A Petros afirmou que o relatório da Brasil Plural faz parte de uma série de medidas deliberadas nas reuniões de cotistas. A fundação informou que investiu R$ 23 milhões no fundo de investimento em direitos creditórios (Fidc), e que a operação foi realizada respeitando-se a legislação vigente à época, o regulamento do fundo e os preceitos das políticas de investimentos.

 

O Brasil Plural, que assumiu a função em maio e ocupa o lugar que foi da factoring Trendbank, não deu entrevista. Em nota, informou que foi contratado pelos cotistas do Fidc para apurar os motivos das perdas aceleradas do fundo. A inadimplência é superior a 80%. A partir da avaliação inicial, diz, “serão efetivadas as medidas necessárias para minimizar e recuperar as perdas dos cotistas”, que, além dos fundos, incluem institutos de previdência de Estados e municípios, e o banco coreano KDB, seu principal cotista.

 

O fundo foi criado pelo Trendbank em 2007 e tinha o banco Cruzeiro do Sul como administrador e a Verax, ligada ao banco, como gestora. Diante dos problemas com o banco, em 2012, o Banco Petra passou a ser o administrador e a própria Trendbank assumiu a gestão. O Petra ficou no posto até março de 2013, quando foi trocado pela Planner. De 2007 a dezembro de 2012, o Deutsche Bank foi o custodiante; sendo substituído pelo Santander.

 

Hoje, 100% dos direitos creditórios que compõem o fundo foram originados sob gestão da Trendbank, que tem também a responsabilidade de guarda de documentos. Procurada, a Trendbank não retornou o pedido de entrevista.

 

Conforme o relatório, a carteira possui 74 cedentes, que englobam empresas cujas ligações permitiram à Brasil Plural dividilas em 15 grupos. Por esse critério, 25% do fundo está concentrado no “Grupo Rock”, que reúne a Dream Rock Entretenimento, e Rock Star Marketing, ligadas a Adir Assad, acusado de participar do desvio de recursos da empreiteira Delta, de Fernando Cavendish. A Rock Star também apareceu nas denúncias que envolvem o suposto esquema de desvio de recursos na Petrobras. Essa empresa de marketing era organizadora da Stock Car – bancos em liquidação como o Cruzeiro do Sul e o BVA, além da Trendbank, já patrocinaram essas corridas de carros, conforme já informou o Valor.

 

A própria Trendbank aparece como uma das principais devedoras do fundo, com 7,5% do volume ou R$ 30,7 milhões. O fundo vendia para a factoring direitos creditórios vencidos e não pagos por valores irrisórios. A Trendbank mantinha relação comercial com os devedores dos créditos e, por isso, possuía informações sobre a capacidade de pagamento deles. Ao recomprar o crédito por valor irrelevante e recuperá-lo, a Trendbank capturava para si o ganho que poderia ser dos cotistas.

 

O Brasil Plural aponta que a troca de administrador do fundo acabou por alimentar a situação delicada em que a carteira se encontra hoje. Quem tinha essa função até março de 2013 era o Banco Petra que adotava “critérios bastante rigorosos”, segundo o relatório, para provisões para devedores duvidosos (PDD). Por conta disso, o fundo ficou desenquadrado em relação ao limite mínimo de cotas subordinadas. Isso equivale a dizer que a Trendbank deveria fazer um aporte para recompor o capital subordinado.

 

Logo em seguida ao desenquadramento, em abril de 2013, o Petra foi trocado pela Planner, que adotou para as PDDs os critérios da Resolução 2682 do Banco Central. Isso resultou em reversões de provisões e reenquadrou o fundo, reduzindo o risco de um evento de liquidação antecipada. Mas a partir daí a rapidez do avanço da inadimplência impressiona. As empresas presentes na carteira continuaram as mesmas, mas os papéis passam por repactuações.

 

Conforme os dados do relatório, dos títulos existentes no fundo, R$ 50 milhões foram adquiridos ainda pelo Petra e o restante do valor foi repactuado ou aceito pela Planner, totalizando, nos seis meses em que ela ficou no posto, os R$ 409 milhões.

Na avaliação do Brasil Plural, em relato aos cotistas, administradores e custodiantes falharam no processo de diligência e cita como evidência que “não se deram conta que foram realizadas cessões para empresas citadas em CPIs “, entre outros pontos.

 

A Planner afirmou que a “metodologia que aplicou para as PDDs foi mais sólida do que a anteriormente existente, no melhor interesse dos cotistas” e de forma transparente. Também observa que teve a iniciativa de investigar as operações do fundo e reunir os cotistas, medidas que resultaram no afastamento do gestor (Trendbank) e fechamento do fundo. Afirma também que todos os negócios foram feitos pela Trendbank no período anterior ao que passou a ser o administrador.

 

A Petra confirma que adota critérios diferenciados para PDDs e informou que neste momento está respondendo aos questionamentos da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre o fundo. A autarquia informou que investiga o Fidc e neste momento não pode fornecer detalhes. O Santander diz que passou a ser custodiante do Fidc em janeiro de 2013, quando ele tinha patrimônio de R$ 330 milhões. O banco acrescenta que 100% das operações cedidas no fundo seguiram o regulamento e as boas práticas de mercado. O Deutsche Bank, custodiante anterior, não comentou.

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